Conhece alguma pessoa com pressão alta? Pode ser que ela use um remédio criado a partir de uma substância descoberta na USP. E pode ser que ela tenha ido ao médico com um aplicativo de transporte criado por nossos estudantes e tenha sido atendido gratuitamenteem um dos hospitais da Universidade. E também pode ser que depois da consulta esta mesma pessoa decida levar o filho em um museu de ciências, para aprender mais sobre um assunto que vai cair no vestibular.
Essa curta história já desmente vários dos mitos envolvendo não só a USP, mas a universidade pública brasileira como um todo. Reunimos dez deles e explicamos se eles fazem mesmo algum sentido.
1 | A universidade pública vive de costas para a sociedade
As universidades públicas brasileiras são frequentemente rotuladas de “torres de marfim” e acusadas de viver “de costas” para a sociedade. Não é verdade. As universidades públicas prestam uma série de serviços importantes à sociedade, por meio de hospitais, museus, orquestras, teatros e outras atividades diversas de “extensão” — como são chamados esses serviços de atendimento à população.
Só a USP tem 4 museus e 15 coleções,que recebem quase meio milhão de visitantes por ano, e cinco hospitais públicos, entre eles o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina, que em 2018 realizou quase 1,5 milhão de atendimentos e 50 mil cirurgias.
A Universidade também oferece centenas de cursos gratuitos e disponibiliza 5 mil vagas para pessoas acima de 60 anos estudarem de graça na universidade.
*A extensão é uma obrigação constitucional das universidades. Como em qualquer serviço público, é claro que sempre é possível fazer mais e melhor; mas dizer que não se faz nada é uma falácia.
A USP também tem
CLÍNICAS ODONTOLÓGICAS: nas cidades de São Paulo, Ribeirão Preto e Bauru.
MUSEUS GRATUITOS: entre eles o Museu de Arte Contemporânea, ao lado do Parque do Ibirapuera e o Museu do Ipiranga.
NÚCLEO DE PESQUISA EM RONDÔNIA: onde, apenas entre 2013 e 2017, foram atendidos 38 mil pacientes e realizados 63 mil exames laboratoriais e muito mais.
2 | Nos países desenvolvidos, a pesquisa é privada
Errado. Nos países ricos, a maior parte do dinheiro que financia a ciência na universidade é público e isso vale até mesmo para as universidades que cobram mensalidades.
No caso dos Estados Unidos, 60% do dinheiro para a pesquisa vêm dessa fonte; na Europa, 77%.
Em maio deste ano, por exemplo, a Alemanha anunciou que governo federal e os estados investirão 160 bilhões de euros no ensino superior e na pesquisa científica entre os anos de 2021 e 2030.
Em seu doutorado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Danilo de Melo Costa fez um estudo comparativo entre Brasil, Canadá e China sobre o financiamento público da educação superior.
De acordo com o pesquisador, no Canadá, o dinheiro público representa de 55% a 60%
do financiamento das universidades e na China, de 40% a 45%.
Outra razão para os investimentos públicos na ciência é o incentivo à pesquisa básica – esse tipo de estudo busca desenvolver o conhecimento científico sobre os fenômenos do Universo e não tem o lucro nem a aplicação prática como objetivo pelo menos a curto prazo.
Pesquisa assim não é de interesse das instituições privadas, ainda que possam levar, no futuro, a grandes avanços tecnológicos e descobertas de alto impacto.

3 | A universidade pública não se relaciona com empresas
As universidades públicas não colaboram com a indústria, não ajudam o setor produtivo, são contra a iniciativa privada, etc e tal. Você já deve ter ouvido alguma frase dessas por aí.
É uma generalização injusta. O que vem ocorrendo, na verdade, é um aumento das colaborações entre universidades públicas e empresas privadas, apesar dos muitos entraves burocráticos e culturais que dificultam essa interação.
A Escola Politécnica da USP, por exemplo, abriga uma parceria de R$ 200 milhões
com a Fapesp e a Shell, para pesquisas inovadoras no setor de gás. Não por acaso, o núcleo de pesquisas tecnológicas da Petrobras também fica dentro de um campus universitário, da UFRJ, com a qual a empresa colabora intensamente desde a década de 1970.
O Centro de Química Medicinal da Unicamp trabalha com três empresas farmacêuticas e de biotecnologia na busca de novos medicamentos; enquanto que o Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia USP/Ipen (Cietec) tem mais de 100 empresas incubadas e 150 graduadas no currículo.
São apenas alguns exemplos emblemáticos, entre muitos que existem por aí.
- Em 2019, a USP regulamentou o compartilhamento e a permissão de usode seus equipamentos, infraestrutura, materiais e instalações em ações voltadas a desenvolvimento e inovação tecnológica.
- Outra iniciativa criada para estreitar as relações da Universidade com empresas e demais instituições científicas é o Sistema USP de Centrais Multiusuários, plataforma para cadastro de equipamentos e laboratórios que podem ser utilizados de forma compartilhada pela comunidade científica da USP e de outras instituições.
- A USP criou até mesmo um guia para ajudar na realização de parcerias com empresas.
4 | A universidade pública é cara demais
Depende. Em relação a quê? O orçamento da USP é de R$ 5 bilhões e meio.
É errado pegar esse valor e simplesmente dividir por seus 90 mil alunos de graduação e pós-graduação.
Realmente, as universidades públicas custam mais do que as privadas. Mas há uma razão muito óbvia e positiva para isso, que muita gente esquece de levar em conta na hora da comparação: a pesquisa científica!
E quando se fala que o governo federal gasta mais com educação superior do que com o ensino básico, é preciso lembrar que, segundo a Constituição brasileira: os municípios devem atuar prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil e os estados, no ensino fundamental e médio.
Nas universidades, os professores também são pesquisadores. E além de lecionar e desenvolver seus estudos, eles têm ainda o papel de formar novos cientistas, orientando trabalhos de mestrado e doutorado, ou seja, alimentando a pós-graduação – e como se vê, a responsabilidade por estes programas é majoritariamente de instituições públicas.
Cursos de pós-graduação no Brasil
19% estão na rede privada
81% estão na rede pública
*O custo operacional das universidades públicas é maior porque elas se dedicam fortemente à pós-graduação (cursos de mestrado, doutorado e pós-doutorado) e à ciência — atividades que exigem uma complexidade muito maior de recursos humanos e infraestrutura física, incluindo hospitais e museus, enquanto que as universidades privadas são basicamente escolas de graduação – no Brasil, 82% dos alunos estão na rede privada, segundo o Censo da Educação Superior do Inep.
5 | A universidade pública é só para os ricos
Tem um mito rolando por aí que as universidades públicas do Brasil “só tem aluno rico”. Mas veja: de cada 3 alunos das universidades federais, 2 vêm de escolas públicas; e a renda média das famílias de onde eles vêm é de um salário mínimo e meio.
Na USP, por exemplo, até 2021, metade das suas vagas serão reservadas só para alunos de escola pública.
A Lei de Cotas e as políticas de inclusão social mudaram a cara da universidade pública no Brasil.
Ok. Mas e como esses alunos conseguem se manter?
As universidades reservam parte de seu orçamento para isso. O dinheiro banca bolsas e auxílios de moradia, alimentação e transporte, assistência em saúde e creches. São formas de ajudar os alunos com dificuldades financeiras a continuar se dedicando à faculdade.
Andam dizendo por aí que a universidade pública brasileira não faz pesquisa. Muito pelo contrário! As universidades públicas, federais e estaduais são as grandes produtoras de ciência e tecnologia no Brasil.
Num ranking das 50 instituições brasileiras que mais produziram trabalhos científicos nos últimos cinco anos, 43 são universidades públicas, e apenas uma é universidade privada.
As top 10 da lista são todas públicas, e apenas uma não é universidade: a Embrapa. Há também universidades privadas que produzem pesquisa científica de qualidade, mas são poucas.





